domingo, 1 de novembro de 2009

O que é o Surf?

O que é, em termos absolutos, o Surf? Filosoficamente qual é a definição para o acto de andar nas ondas? Quem souber a resposta que ponha o dedo no ar. Eu não faço a mínima ideia. Devo confessar que durante os quase vinte anos desde que me viciei no prazer das ondas que nunca pensei muito nisso, nunca me preocupou saber o que era o Surf. O simples prazer das horas, os milhões de segundos passados na água eram, foram sempre, razão e explicação suficiente. É claro que há as revistas, os livros, os filmes. Os recortes para forrar os dossiers, a necessidade de preencher os sonhos, os desenhos de ondas imaginárias, a curiosidade de saber mais, aprender mais. Mas isso não é o Surf, é apenas a humana predisposição para o conhecimento e será que pelo conhecimento, pela filosofia, podemos chegar à verdadeira essência do que é o Surf? Quantas revistas, quantas entrevistas, crónicas, ficções, quantas palavras são necessárias para uma verdadeira descrição do que é o Surf, a mais empírica, mais sensorial, mais corporal de todas as experiências? Melhor do que sexo. No meu Webster’s Dictionary Surf é noun the foam and swell of waves breaking on the shore. (origin unknown) A espuma e o movimento ondulante das ondas que quebram na costa. Origem desconhecida. Será esta uma descrição adequada? Estará, nesta palavra de origem desconhecida, contida a essência do que é o Surf? Ou o Surf é algo para lá das palavras? Tenho nas estantes uma colecção de centenas de revistas de Surf que guardo escrupulosamente, obcecadamente, desde os meus dez anos, será que nessas centenas de páginas, nesses milhares de fotografias, nesses milhões de palavras escritas em várias línguas diferentes, mas todas usando essa mesma palavra de origem desconhecida, será que na súmula de todos os livros e revistas que já li sobre Surf está O Surf? Nem mesmo Matt Warshaw e as 774 páginas da sua Encyclopedia of Surfing têm a resposta. E será que isso interessa? Quando a ideia deste blogue surgiu, em pleno boom da blogoesfera nacional, o primeiro sentimento que se me acometeu foi de pavor, um medo terrível de não saber o que escrever sobre Surf. Cheguei mesmo a deixar aqui o meu testemunho, e não estava brincar, de que um verdadeiro surfista não escreve porque todo o seu tempo deve ser passado na água e as palavras não são impermeáveis nem estanques. É por isso que o Surf só pode ser isso mesmo, uma palavra. Apenas uma sílaba formada por quatro letras, de origem desconhecida, que prenuncie um som que diz Surf. Nos últimos tempos este blogue assumiu o aspecto de autêntico fórum, em que tudo e mais uma coisa têm sido discutido, muitas vezes com a paixão e a irracionalidade de que só verdadeiros surfistas são capazes. Do que tenho lido há um elemento comum que me têm fascinado, existem tantas opiniões e visões do que é o Surf e de tudo o que ao Surf está associado como pessoas que comentam. Provavelmente a melhor descrição que podemos encontrar para o Surf é isso mesmo. O Surf é aquilo que cada surfista individualmente crê que o Surf é. E é perfeitamente justo que assim seja, porque da mesma maneira que não existem duas pessoas iguais, nem duas ondas iguais, como poderia o Surf ser uma só coisa. Surf é o milésimo de segundo de emoção que cada um de nós experimenta de cada vez que está em sintonia com a fugaz e singular energia de uma onda. Todos nós sabemos o que é mas nenhum de nós saberá explicar ao outro por palavras que este entenda. Como tudo na vida também a essência do Surf está perdida no turbilhão, no múltiplo caos da existência. É apropriado que assim seja porque tal como da vida também a origem do Surf está no sol, nas flutuações da radiação solar que atingem a nossa atmosfera, no princípio de tudo. O que fazemos neste blogue é escrever sobre a vida, sobre as nossas vidas e em cada palavra, cada frase, cada parágrafo esperamos que saia algo parecido com Surf. Cada um destes textos é apenas mais uma das milhões, talvez biliões, de hipótese possíveis para a definição dessa palavra de origem desconhecida que é o Surf. Será que isto é importante? Não. O importante é que hoje não surfei e por isso estive mais longe do princípio de tudo.

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